EXPERIÊNCIA GENÉTICA: Supremo declara constitucionalidade da Lei de Biossegurança



Na regulamentação das atividades relativas a organismos geneticamente modificados (OGMs), há uma inequívoca preponderância do interesse da União para construir um tratamento uniforme em todo o território nacional. Além disso, a Constituição criou um amplo espaço de conformação ao legislador quanto à proteção ambiental.


Com esse entendimento, o Plenário do Supremo Tribunal Federal validou a Lei de Biossegurança, de 2005, que regulamenta normas de segurança e mecanismos de fiscalização relacionados a OGMs e seus derivados. A sessão virtual se encerrou na segunda-feira (21/8).


Diversos trechos da lei foram questionados, ainda no ano de sua publicação, pela Procuradoria-Geral da República, por meio de ação direta de inconstitucionalidade. O órgão alegou limitação da competência dos estados e municípios e significativo impacto ambiental.


Prevaleceu no julgamento o voto do ministro Gilmar Mendes, decano da corte. Ele foi acompanhado integralmente pelos ministros Dias Toffoli, Luiz Fux, Luís Roberto Barroso, Alexandre de Moraes, Cristiano Zanin e André Mendonça.



Quanto à alegação de violação da competência concorrente dos entes federativos para promover a proteção do meio ambiente, Gilmar ressaltou que a comercialização de OGMs "transcende a esfera de interesse de estados singulares".


Para ele, não existem peculiaridades regionais sobre o tema que autorizem um estado a alterar as conclusões da fiscalização de segurança federal (baseadas em critérios científicos e uniformes).


Além disso, caso as empresas e os pesquisadores precisassem buscar a aprovação de 27 agências regionais, "avanços tecnológicos na indústria e no setor de medicamentos seriam inviabilizados". O ministro lembrou que, durante a crise da Covid-19, muitas vacinas usavam insumos com OGMs — ou seja, a necessidade de chancela em cada estado poderia atrasar as medidas sanitárias.


Com relação à suposta redução da proteção do meio ambiente, a PGR contestou a competência da Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio) —  órgão colegiado técnico vinculado ao Ministério da Ciência e Tecnologia — para identificar riscos à saúde humana ou ao meio ambiente em produtos e atividades derivados do uso de OGMs. Pela lei, é a CTNBio quem decide, nesses casos, quando é necessário um licenciamento ambiental ou um estudo prévio de impacto ambiental.


Gilmar destacou que estudos do tipo não são obrigatórios em todas as atividades de impacto ao meio ambiente, mas somente "naquelas consideradas de significativa degradação".


De acordo com ele, a Constituição, "ao contrário de estabelecer uma obrigatoriedade de realização de estudo de impacto ambiental, delegou ao legislador o poder de conformar esse instituto".


O magistrado ainda apontou que tal estudo não é obrigatório nem mesmo no fluxo ordinário de licenciamento ambiental estabelecido pelo Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama). Pelo regulamento, a avaliação da necessidade é delegada ao órgão responsável pelo licenciamento, conforme critérios específicos estabelecidos para cada atividade.


Assim, a lei de 2005 apenas "submete essa análise a órgão técnico especializado em biossegurança", o que é "razoável e integralmente compatível" com o comando constitucional.


Gilmar ainda explicou que a CTNBio é formada por especialistas em  saúde humana, meio ambiente, área animal, área vegetal e defesa do consumidor, além de representantes dos ministérios. "A lei impugnada atribuiu a órgão técnico adequadamente estruturado e qualificado a tarefa de analisar a necessidade de submeter OGM ao procedimento de licenciamento ambiental, o que não contraria, mas, sim, concretiza o princípio da precaução", assinalou o magistrado.


A PGR também argumentou que a Lei de Biossegurança desconsiderou a existência de decisões judiciais contrárias ao plantio comercial de soja geneticamente modificada, sem que houvesse prévio estudo de impacto ambiental. Mas o ministro observou que a autorização específica para tal plantio foi concedida ainda em 2005. Por isso, declarou a perda do objeto da ação quanto a esse ponto.


O relator do caso, ministro Kassio Nunes Marques, não conheceu da ADI também com relação a outros dispositivos, mas ficou vencido. Já os ministros Luiz Edson Fachin, Cármen Lúcia e Rosa Weber, presidente do STF, votaram pela inconstitucionalidade de todos os dispositivos validados pela maioria da corte.


Na visão do advogado João Emmanuel Cordeiro Lima, sócio do escritório Nascimento e Mourão Advogados, que representa a Associação Brasileira de Bioinovação (ABBI), a decisão do Supremo deve ser comemorada. "Foram mantidos o arranjo institucional e os procedimentos que estão funcionando adequadamente há mais de 18 anos, entregando soluções valorosas e seguras para a sociedade em áreas relevantes como saúde, alimentação e química industrial."


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ADI 3.526










Por Revista Consultor Jurídico

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