Como a mulher deve, e pode, se defender de violência doméstica

A saída de mulheres contra a cotidiana violência que cresce em estatísticas, como no Anuário Brasileiro de Segurança Pública



Goiás ficou em 7° estado com mais ocorrências de violência contra a mulher segundo dados do  Anuário Brasileiro de Segurança Pública de 2023. Em 2021, foram registrados 35.583 casos de violência doméstica contra a mulher. No ano passado, o número de vítimas aumentou para 38.470. Segundo o Fórum Brasileiro de Segurança Pública, todas as formas de violência contra a mulher cresceram em 2022.


Desde o assédio moral e sexual até o feminicídio, diferentes dimensões da violência marcaram a experiência da vida de mulheres de todas as idades no estado. Diante deste cenário, é válido questionar quais os direitos das mulheres que a lei sobre legítima defesa procura resguardar nos casos em que o homem é um agressor. 


Para o advogado criminalista Felipe Borges de Alencar, a lei penal não correlaciona o instituto da legítima defesa especificamente aos casos de violência contra a mulher. “Existem em nosso diploma normativo regras direcionadas à proteção da mulher, como, por exemplo, a Lei Maria da Penha (Lei n° 11.340/06), criada para coibir e prevenir a violência doméstica e familiar contra a mulher e a figura do feminicídio”, explica. O especialista informou ao Hoje que o feminicídio consiste no assassinato de uma mulher por razões da condição de sexo feminino. “Isso qualifica o crime de homicídio (matar uma pessoa) e eleva o patamar da pena a ser cumprida”, complementou. Como os casos de agressão contra a mulher não se enquadram na lei de legítima defesa, os limites legais dessa ação repousam em alguns critérios.


“Para ficar configurada a legítima defesa, a pessoa deve reagir a uma injusta agressão, que esteja acontecendo naquele momento ou que se encontre prestes a ocorrer”, orienta Felipe Borges de Alencar.


Proteção legal


Segundo o advogado criminalista, ao ser violentada fisicamente, a reação da mulher deve ser imediata. “O meio utilizado para fazer cessar a agressão precisa ser suficiente e moderado para repelir o comportamento do agressor, justamente porque o excesso proveniente dessa reação poderá ser punido (art. 23, parágrafo único, do Código Penal). Portanto, o limite para incidência da legítima defesa repousa nos critérios acima estabelecidos”, afirma. Felipe Borges ressalta que a mulher pode se proteger legalmente caso seja vítima de alguma agressão. “É imprescindível que as vítimas de violência de gênero registrem ocorrência (relatem as agressões) nas Delegacias Especializadas de Atendimento à Mulher.”


Ele lembra que a Lei Maria da Penha criou mecanismos para obstar o comportamento violento contra a mulher, dentre eles, as medidas protetivas de urgência (arts. 22, 23 e 24 da Lei n° 11.340/06), que podem ser solicitadas a qualquer momento, gerando restrições e limitações aos direitos dos agressores, sendo que, uma vez descumpridas, podem gerar a decretação da prisão preventiva. Além disso, o especialista acrescenta que várias medidas protetivas previstas na Lei Maria da Penha podem ser solicitadas pela mulher.


“Com o objetivo de cessar agressões físicas e psicológicas, há possibilidade de solicitar afastamento do agressor do lar, proibi-lo de se aproximar da ofendida e seus familiares, fixando limite mínimo de distância, impedir o contato com a vítima e seus familiares por qualquer meio de comunicação e até mesmo proibir a frequentação de determinados lugares com o objetivo de garantir a integridade física e psicológica da mulher vítima de violência doméstica”, destaca Felipe Borges.


Artes Marciais: uma saída para a defesa


Uma alternativa para as mulheres saberem se defender em casos de agressão é aprender e praticar artes marciais. Carol Prestes contou à reportagem do jornal O Hoje que o Dojo Padma é o lugar perfeito para isso. “Nasceu em 2017, a partir de um desejo meu de usar o Karatê, que eu já praticava desde criança, de uma forma diferente, com a intenção de quebrar o tabu de ser uma arte marcial masculina (assim como futebol e outras lutas)”, informa. A atleta relata que, ao longo de 27 anos de karate, percebeu que a maioria dos ambientes são predominantemente ocupados por homens e que gostaria de mudar esse cenário.


“Comecei em 1996, com 8 anos de idade. Conheci a Shihan Juliana Braga, mestre campeã mundial, e fiquei encantada ao ver uma mulher como sensei. A academia dela sempre teve mais meninas, uma exceção dentre as outras e o motivo era o fato de ser uma mulher conduzindo. Aos 13 anos, me graduei faixa preta e já comecei a dar aulas na academia, também competi por muitos anos, ganhei várias competições”, conta a hexacampeã brasileira. Conforme ela explica, o Dojo Padma surgiu em um momento de crise profissional, em que queria fazer algo que a realizasse.


 “Nessa fase de 2017, foi quando tive a ideia de unir o Karatê com uma causa maior, de lutar pela igualdade”, afirma. Eunice Fleury, jornalista, produtora e repórter, é uma das alunas de Carol. “A ideia principal foi criar um ambiente acolhedor onde nós mulheres possamos praticar o karatê de forma segura e onde a gente também se sinta segura. Então assim, é um ambiente de acolhimento mesmo, um ambiente muito seguro para mulheres tanto da prática do karatê em si como também um espaço de apoio psicológico”, enfatiza. O Dojo Padma se localiza no Coletivo Centopeia, no Setor Sul, próximo à Praça Cívica.


Canais de denúncia


Segundo Isabella Joy, titular da Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher (Deam) de Anápolis, nos casos de agressão, muitas mulheres não conseguem se proteger sozinhas.


“Então, existem canais como o 190, da polícia, o disque 180, de denúncia anônima, e as medidas protetivas que a mulher pode solicitar, como o afastamento do lar. A mulher pode pedir que o agressor não chegue perto dela ou de nenhum familiar, que o autor não tenha nenhum tipo de contato com a vítima inclusive por redes sociais Se o agressor tem porte de arma, pode pedir a suspensão, dentre outras medidas protetivas que podem ser solicitadas e tem que ser deferidas pelo juiz”, destaca.




Por O HOJE.com

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