PARTE PELO TODO: Segurança Pública pode melhorar se for administrada pelo poder municipal

 
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A problemática do assunto tratado reveste-se de objetividade em seus aspectos de causa e efeito. O crime organizado vem crescendo a cada tempo, consolidando-se como ator principal do teatro social, alcançando o absurdo de admitir que seu principal objetivo é a tomada do poder, ou seja, a derrocada do estado coroado pela incompetência absoluta de gerir os problemas enfrentados, eximindo-se da responsabilidade de proteger a sociedade e seu patrimônio.
 
Corroborando as afirmações anteriores o professor Luís Flávio Gomes e o ilustre Raul Cervini, esclarecem que o clamor público precisa ser atendido e que a legislação penal tal qual ela é serve-se apenas de calmante ao povo, porquanto, se desejamos enfrentar corretamente a organização do crime, devemos abandonar as falaciosas medidas repressivas puramente paliativas e simbólicas aplicadas no trato com o criminoso. (GOMES E CERVINI, 1995, p. 32-33).
 
Outrossim, a aplicação de políticas públicas eficazes no campo da segurança pública a fim de atuar preventivamente no combate ao crime, permitirá ao estado retomar o controle absoluto do poder, impedindo que facções criminosas organizadas aliciem indivíduos nocivos, tendo em vista, a derrocada do poder estatal.
 
Balizando o assunto, devemos ressaltar a importância dos municípios nesse cenário, porquanto, o cidadão está efetivamente nas cidades brasileiras e não nos estados ou nas dependências da União, o indivíduo vive de fato no ente municipal e é ali que os problemas acontecem, é ali que os reflexos da ineficiência estatal se cristalizam.
 
O Plano Nacional de Segurança Pública (PNSP) contempla efetivamente a recepção dos municípios no contexto geral destinado ao assunto. É mister que os governos municipais têm absoluta competência para estabelecer as metas e diretrizes das ações de política local voltadas à segurança pública.
 
Ademais, desde 2002, o Plano governamental mencionado recepciona e admite passivamente a atuação municipal no âmbito da segurança através de guardas civis municipais constituídas regularmente, e que a gestão e operação daqueles agentes públicos consolida-se dia após dia lastreado na inteligência do § 8º do art. 144 da CF/88.
 
Municipalizar o serviço de segurança pública é desonerar substancialmente a sobrecarga dos governos estaduais no assunto em questão, o que de outro norte, ainda há se considerar a possibilidade de influência direta e positiva nos índices alarmantes de outrora da criminalidade e insegurança vivenciadas pelo cidadão.
 
Porquanto, discutir, aplicar, estimular, desenvolver ações no âmbito da segurança pública municipal, não é senão, contribuir preventivamente para inocorrência de certos delitos, vez que, o agente público que aplica a medida direta de controle é aquele que também reside no município, de forma que conhecer cada peculiaridade da comunidade em que atua.
 
A percepção do governo federal em admitir os municípios no rol de entes com responsabilidade direta sobre a segurança pública, atendendo aos apelos e mudanças sociais que recaem sobre a problemática apresentada, é senão, a visualização projetiva do cenário futuro no pacto nacional pela segurança, sendo fundamental que no papel protagonizado pelos estados-membros e pela União, a consolidação dos gabinetes municipais de tratamento das questões de proteção municipal do cidadão deve favorecer estruturas institucionais para gestão compartilhada na resolução do problema.
 
O Sistema Único de Segurança Pública (SUSP) articula as ações que permeiam o tema, na esfera federal, estadual e inclusive a municipal, o que leva a interpretar de maneira vanguardista que os municípios figuram como protagonistas importantes no contexto social da questão.
 
Porquanto o maior obstáculo que acreditamos existir é a resistência dos órgãos constituídos para enfrentamento da problemática, os quais tentam consolidar um entendimento controvertido de que haverá usurpação de competência, caso os municípios passem a instituir órgãos responsáveis pela segurança pública em âmbito municipal.
 
A municipalização da segurança traz em seu bojo a renovação da força ativa de atuação, capaz de fazer frente ao crime organizado, em ações e estratégias articuladas, onde, através dos planos municipais de segurança e proteção cidadã, é possível diagnosticar o foco embrionário dos delitos, cujo diagnóstico permitirá o incentivo por parte do ente municipal das pesquisas e estudos destinados à contenção preventiva e também repressiva se houver necessidade, das inúmeras manifestações de abuso e violência cometidos contra a população de maneira geral.
 
Não menos importante, ainda destacamos a responsabilidade do gestor municipal sob a égide do dever estatal em desempenhar o papel funcional de agir, assumindo sua parcela de responsabilidade no âmbito do art. 144, §8º disposto no texto constitucional de 1988, o que via de regra, consubstancia-se, no caso de inércia do gestor público, nos aspectos punitivos da responsabilidade civil da administração pública e no abuso de poder.
 
É bem verdade que a extração de responsabilidade do município nesses casos encontra resistência em um deliberado conflito de competência que produz o antagonismo entre as forças inviabilizando ações preventivas, cooperativas e integradas necessárias (DANTAS FILHO, 2009, p.48).
 
De outro norte, conceber o combate ao crime, organizado ou não, em âmbito municipal é condicionar as forças de segurança interativamente para apresentação de resposta rápida a fim de solucionar problemas que só podem ser detectados pelos munícipes, os quais, em razão da proximidade do agente municipal de segurança pública combina ação preventiva com ação de inteligência na atuação em face da problemática criminal.
 
A Constituição Federal, Carta suprema normativa da cidadania brasileira, promulgada em 1988, traz em seu bojo, especificamente no §8º do art. 144 a seguinte redação, in verbis:
“Art. 144. A segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, é exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, através dos seguintes órgãos: [...]§ 8º - Os Municípios poderão constituir guardas municipais destinadas à proteção de seus bens, serviços e instalações, conforme dispuser a lei.(grifo nosso)”
 
Tal disposição afeiçoa-se à nova perspectiva sócio jurídica na mesma medida com que se apresenta a hermenêutica do assunto aos operadores jurídicos. Porquanto, nossa Magna Carta, abre amplo espaço protecional e de extrema segurança jurídica, quando faculta aos municípios a possibilidade de instituírem um braço armado para exercício do poder de polícia municipal sob a égide discricionária do gestor.
 
Nasce aí a possibilidade de criação de um órgão necessário para fiscalização e controle das ações humanas, assim como a proteção dos bens, serviços e instalações municipais no âmbito da segurança pública. De forma que, a partir do comportamento permissivo do constituinte originário em facultar aos municípios a possibilidade de complementação das lacunas existentes no âmbito desse serviço essencial, que é o de segurança pública, cada gestor na sua esfera atributiva de responsabilidade tem liberdade para criar uma guarda municipal destinada à proteção das coisas mais importantes para uma sociedade.
 
Sob análise detida, é possível constatar de maneira coerente, alguns aspectos importantes para se definir qual foi a intenção do legislador ao estabelecer genericamente a proteção de bens serviços e instalações, senão vejamos quais as dimensões de cada aspecto do dispositivo constitucional em tela: Quanto à proteção, entendemos ser uma forma de proteção, um acervo de medidas contra agressões e danos.
 
Nesse sentido, proteção é gênero, do qual a prevenção é espécie destinada evitar o dano ou agressão a fim de antecipar as ações danosas. Quanto aos bens, como poderia ser considerada a vida de um cidadão sob a ótica estatal, senão como o aspecto de maior relevância a desfrutar de proteção? Há, nas proposições apresentadas, uma consideração relevante quanto ao que seja considerado bem, todavia, ousamos mencionar no elenco hipotético, a vida do cidadão, como já dito, trata-se do bem mais valioso a ser protegido pelo Estado.
 
Quanto às instalações, essas sim, compõem o patrimônio material público, o qual permite o desenvolvimento da sociedade em seus aspectos econômicos e físicos, aos quais, acrescentamos duas distintas espécies de patrimônio, os de uso comum e os especiais, sendo estes, aqueles destinados ao abrigo dos órgãos e entidades que compõe a administração pública.
 
Ante tais apontamentos, há que se considerar que para o exercício do poder de polícia delegado ao agente pelo ente estatal, é fundamental analisar que a intervenção de garantia e controle se dará no aspecto humano, eis que a interação ocorre nesse sentido.
 
Mas, não se mostra razoável, que sendo a segurança pública dever do estado, direito e responsabilidade de todos os cidadãos, não possa, a administração pública municipal, constituir órgão regular, delineado por metas e diretrizes de ações parametrizadas, no intuito de cumprir seu papel constitucional, porquanto, a guarda municipal é legitimada para garantir o que é de direito e responsabilidade de todos sob o manto protetivo do estado em âmbito municipal.
 
Pactuando esse entendimento assevera Braga (1999, p.34) que “o combate à criminalidade não é exclusivo ou privativo da polícia militar, mas de todo cidadão que, nesse particular, é detentor de fração de poder de polícia, prevalecendo a regra ‘ominis civis est miles’ (todo cidadão é um militar);”
Assim, é verossímil que os municípios têm plena e absoluta legitimação e legalismo para constituir guardas municipais dotadas do efetivo e real poder de polícia, vez que, não se podem privar as ações do ente municipal, na esfera de sua competência, para legislar sobre assuntos de interesse local, porquanto é o que dispõe a Magna Carta brasileira de 1988.
 
Com efeito, a referida instituição concorre em igual teor e modo com as polícias, estadual e federal, no que tange o princípio da autoexecutoriedade, conquanto, cooperam na preservação da ordem pública, proteção efetiva de próprios municipais e incolumidade dos indivíduos, do patrimônio geral, de órgãos e entidades da administração pública direta e indireta.
 
No exercício do poder de polícia, o estado, abriga a sociedade como um todo da prostituição, das perversões sexuais, da embriagues, obscenidades, jogos de azar, entorpecentes, entre outros. Com isso consegue manter em elevado patamar o princípio constitucional da dignidade da pessoa humana.
Quanto a possível ofensa ao princípio da legalidade, sem temerária razão, ousamos afirmar que tanto a suprema corte brasileira, quanto as demais, pactuam pelo mesmo entendimento de que as guardas municipais são órgãos que atendem ao disposto no texto constitucional em seu art. 144§8º e por isso, possuem legitimidade para fiscalizar o transito aplicando multas, prender criminosos em flagrante delito, bem como dar proteção consequente á incolumidade dos cidadãos.
 
À guisa de inúmeras conjecturas, a guarda civil municipal exerce em seu papel o poder de polícia administrativa, porquanto, segundo o mestre Hely Lopes Meireles “Poder de Polícia é a faculdade de que dispõe a Administração Pública para condicionar e restringir o uso e gozo de bens, atividades e direitos individuais, em benefício da coletividade ou do próprio Estado” (MEIRELLES, 2002, p. 127).
 
O que distancia o poder de polícia administrativo do poder de polícia judiciário é que este está para, via de regra, apuração de ilícitos penais e cumprimento de ordens da autoridade judiciária estadual e federal e aquele está para o controle e regulamentação impeditiva da ação violadora dos delinquentes em face da comunidade municipal (MELO, 1999, p. 359). Ademais a regulamentação efetiva e embasadora do referido poder estatal encontra lastro favorável em dois grandes princípios norteadores das ações do ente público, quais sejam, a autotutela, autoexecutoriedade e a supremacia do interesse público.
 
Nessa esteira, pugnando pelo bem maior social, a administração pública lança mão de seu poder regulatório para através de agentes executores realizarem a paz social em âmbito municipal.
Por derradeiro, não há que se falar em incompetência ou inexistência de regulamentação para que os gestores municipais, no âmbito de suas atribuições, assumam a parcela de responsabilidade que lhes cabe e que lhes fora atribuída pelo art. 144 §8º da Constituição Federal de 1988, com efeito, e amplamente dissecado, a municipalidade tem atuação direta na vida do cidadão, exercendo através de seus poderes e atribuições a garantia e proteção de seus bens, serviços e instalações.
 
Também entendemos ser a hora em que o grande “Leviatã” de Thomas Hobbes deixa seus aspectos medievais e, a partir de uma imagem vanguardista, pelos braços municipais de administrar, assume as rédeas deste carro desgovernado chamado segurança pública.
 
Porquanto, os cidadãos já estão cansados de viver sob o manto da omissão, ineficiência dos serviços públicos e incompetência da administração estatal, limitando-se a resguardar sua proteção incólume, aos muros altos, grades janelares e alarmes de toda sorte, sempre à mercê da organização do crime pautada na soberba e ignorância secular de integrantes cupulares dos órgãos responsáveis pela conduta protetiva do Estado.
 
REFERÊNCIAS:

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MEIRELES, Hely Lopes. Direito municipal brasileiro. 16. ed. São Paulo: Malheiros, 2002.
MELLO, Celso Antônio Bandeira. Curso de direito administrativo. 12. ed. São Paulo: Malheiros, 1999.
TZU, Sun. A arte da Guerra. São Paulo: Madras. 2004.

Aulus Eduardo Teixeira de Souza é advogado e autor do livro Guarda Municipal: A responsabilidade dos municípios pela segurança pública (Curitiba: Juruá, 2015). Pós-graduado em Docência Superior pela Universidade Norte do Paraná; pós-graduando em Direito Tributário, Constitucional e Administrativo pela Escola Paulista de Direito; bacharel em Direito pela Universidade do Sul de Santa Catarina.
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