INDIANA FAZ GREVE DE FOME HÁ 11 ANOS EM PROTESTO CONTRA VIOLÊNCIA MILITAR

Jejum de ativista Anna Hazare chama atenção para luta de mulher presa, internada em hospital e alimentada à força


Ela chegou em uma ambulância, magra e pálida como um fantasma, com um tubo de respiração colocado em seu nariz. Cercada por policiais, foi conduzida à sala do juiz em Imphal, na Índia, para um ritual quinzenal que já repetiu centenas de vezes. E veio a pergunta: Ela estava pronta para acabar com seu jejum?


Irom Chanu Sharmila, uma poetisa e ativista de 39 anos, deu a resposta de costume: não. E assim, foi levada de volta para o seu quarto de hospital onde passa os dias isolada, sendo alimentada à força com uma mistura de nutrientes pelo tubo colocado em seu nariz. Esta tem sido sua rotina há 11 anos.
Recentemente, uma greve de fome de 12 dias do ativista social Anna Hazare paralisou o sistema político da Índia, chamou a atenção da imprensa local e inspirou centenas de milhares de pessoas em todo o país a participar de sua jornada contra a corrupção.

Mas na Índia, onde a greve de fome serve como uma ferramenta comum de protesto - desempenhando um papel de destaque até mesmo na criação de um Estado moderno -, nem todos os protestos chamam a atenção do público da mesma maneira. Ao longo do tempo, a luta solitária de Sharmila caiu no esquecimento. Sua causa: eliminar as leis que protegem as forças de segurança de repressão neste remoto canto do nordeste da Índia.

Ela passa o dia isolada de seus partidários, de sua família e da mídia. As autoridades controlam com rigor o acesso a ela. Ainda assim, sua determinação é inabalável. "Sou forte", garantiu Sharmila, com olhos fundos, em uma breve entrevista na sala do juiz. "Estou apenas à espera de Deus e de seu julgamento infalível."

As imensas fronteiras da Índia englobam uma diversidade impressionante de terreno, cultura, religião e etnia, enquanto o país luta para permanecer fiel a seus ideais democráticos. Manipur fica no canto nordeste da Índia, um dos sete Estados do nordeste que se encontram do outro lado da estreita faixa de território que faz fronteira com o norte de Bangladesh.

Na sua aparência e cultura, as pessoas desta região têm mais traços em comum com o Oriente da Ásia do que com a da distante capital, Nova Délhi. Várias facções lutaram pela independência e autonomia desta fragmentada região e o governo respondeu com dura repressão militar.

No local, os soldados são muito mais livres porque estão protegidos de serem acusados judicialmente por uma lei conhecida como o Ato dos Poderes Especiais das Forças Armadas, de 1958. Segundo a lei, os militares podem prender sem mandado, atirar para matar em caso de suspeita e usar força letal para acabar com encontros de cinco ou mais pessoas. Eles não podem ser processados sem permissão explícita do governo central, algo que acontece raramente.

Com isso, a lei levou a décadas de abusos dos direitos humanos. Milhares foram mortos, feridos, detidos e torturados com impunidade, dizem os ativistas de direitos humanos da região.

O episódio que levou Sharmila a iniciar sua greve de fome ocorreu em uma tarde do dia 2 de novembro de 2000, em uma vila chamada Malom e localizada à beira do povoado de Imphal. Uma misteriosa explosão ao longo da estrada principal que conduz à vila fez com que soldados fossem enviados para tomar conta da vila. Eles mataram 10 pessoas, incluindo adolescentes e uma avó de 62 anos. Sete dos mortos foram baleados à queima-roupa enquanto formavam filas em um ponto de ônibus - os outros três foram mortos a tiros em outras partes da aldeia.

Fonte: Jornal A Crítica Catarinense

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