Para Natalie, os jovens precisam de apoio ao deixar a prisão e ela sugere um 'mentor'.
Infratora na adolescência, a britânica Natalie Atkinson, de 24 anos, tornou-se uma referência de ressocialização ao mudar de vida e se dedicar aos estudos de criminologia, com ambição de se tornar policial.
Natalie foi detida ainda quando era menor de idade, por crimes como roubo, agressão e depredação, e, depois, chegou a ir para uma penitenciária.
A jovem agora defende uma nova Justiça, focada na ressocialização de infratores na Grã-Bretanha. Leia o depoimento dado a ela para a BBC:
Se qualquer um me perguntasse o que eu gostaria de ser quando eu crescesse, eu diria: policial.
Atualmente, estudo criminologia e estudos forenses na Universidade de Cumbria (Grã-Bretanha) e espero conseguir um mestrado em política penal na London School of Economics, com o objetivo de me dedicar a políticas criminais para jovens.
Há apenas alguns anos, eu não estava estudando o sistema criminal, eu estava presa por ele.
Eu cometi mais de cem crimes e tive mais de 50 condenações por agressão. Cumpri penas em unidades para menores infratores e, em uma prisão assim, que completei 18 anos.
Comecei a receber assistência quando tinha 13 anos e, aos 18, já tinha morado em cerca de 25 endereços diferentes. Comecei a perambular pelo centro da cidade de Lancaster e a me envolver em brigas. Me sinto culpada agora por ter sido desse jeito, mas não havia como me controlar ou me convencer.
Acho que eu me rebelava contra a autoridade e eu realmente tinha muitos ataques de raiva. Quando comecei a receber ajuda, senti como se minha família tivesse perdido o direito de me dizer o que fazer. Policiais são figuras de autoridade e, no momento em que eu me comuniquei com um policial, eu pensei que eles não iriam me controlar.
A maioria dos meus crimes também foi cometida sob a influência de álcool.
Círculo vicioso
Eu acabei em um círculo vicioso e tinha vontade de voltar para as unidades de segurança, porque era o único lugar onde eu me sentia resolvida, segura e não precisava me preocupar com a vida.
Quando completei 18 anos, saí das unidades para menores e fui para uma prisão para mulheres adultas, a HMP Styal. Com meu histórico de crimes, fui colocada na mesma ala de criminosas graves, como estupradoras e assassinas. Havia agressão constante e violência.
Quase metade das mulheres e quase um quarto dos homens na prisão sofrem de ansiedade ou depressão. Uma mulher tirou a própria vida nos primeiros dias da minha condenação. Na prisão, eu fiquei deprimida, solitária e com medo. Comecei a me flagelar. Eu também me tornei viciada em um substituto da heroína chamado Subutex.
Quase 60% dos adultos que cumprem condenações mais curtas vão reincidir no prazo de um ano após serem soltos. Virei a minha vida graças ao incentivo positivo fora da prisão.
A educação também me ajudou a começar a acreditar que eu poderia usar minhas próprias experiências de vida para beneficiar outras pessoas. Assim, comecei a ir para a faculdade.
Eu fui libertada da prisão com um auxílio mensal de 46 libras (R$ 171), minhas roupas na mochila e nenhuma ajuda para encontrar uma casa. Tive a sorte de ficar com amigos quando fui libertada, mas quase 40% dos infratores saem da prisão sem ter um lugar para morar.
Não é fácil conseguir um emprego tendo um histórico criminal. Eu odiava contar a história a recrutadores e ver a expressão de horror no rosto deles.
No começo, eu ia e voltava de centros de empregos, mas depois acabei indo para o trabalho voluntário, que me ajudou a ter confiança e autoestima. Atualmente, trabalho em um albergue para sem-teto que abriga adultos, incluindo alguns jovens infratores, e quero usar o meu passado para ajudar aqueles que estão passando pelas mesmas coisas que eu fiz.
Eu acho que para entender o seu passado você tem que enfrentar o seu passado e tem que entender o efeito que seu comportamento teve sobre outras pessoas.
Ressocialização
Eu gostaria de ver um maior foco na Justiça que promove a ressocialização, na qual o infrator seja encorajado a assumir a responsabilidade por suas ações. Também é preciso dar mais apoio a adultos com problemas na comunidade, em vez de apenas colocá-los na prisão, liberá-los e esperar que eles mudem de vida.
A prisão funciona para algumas pessoas, mas para alguns dos jovens que conheci, só cria mais raiva e uma divisão maior entre esses jovens e a sociedade.
Acho que precisamos de um sistema de Justiça completamente diferente para jovens de 18 a 25 anos, com mentores, que seriam, de preferência, ex-reclusos, para estarem ao lado dos infratores assim que esses deixassem o sistema prisional. Mas também não há uma receita única. Nós nunca vamos conseguir um sistema de Justiça que funcione para todos.
A questão também é sobre o indivíduo. Não importa o quanto de apoio é oferecido, se esse indivíduo não estiver pronto para fazer uma mudança.
Foi só quando eu assumi a responsabilidade pelos meus atos e aceitei o que tinha feito de errado que eu comecei a mudar. Acho que todo mundo pode usar a sua própria experiência de vida para realmente fazer algo positivo.
Muitos ex-detentos pensam que eles não têm conserto e que não vão conseguir na vida, então eu gostaria de ficar como um exemplo.
BBC BRASIL